quarta-feira, 3 de março de 2010

DIAS EM TRÂNSITO PARTE 5 FINAL

por Carlos Magalhães

Está tudo acabado? Os dias passaram rápidos como estrelas cadentes nas noites estreladas de verão. O sentimento de saudade e uma pequena tristeza tomam conta do meu corpo. A tristeza de estar longe daqueles que ficaram tão próximos em tão pouco tempo. A tristeza em saber que só daqui a algum tempo estaremos todos juntos novamente. Quem são eles? Quem somos nós? A vida toda dançando na nossa frente e a única coisa que podemos fazer é tentar acompanhar a música, bailar feliz, alegre, sorrindo para rostos desconhecidos, abraçando e trocando carinho com pessoas que nunca vimos antes. Todos unidos por um mesmo sentimento, por uma mesma força, a cultura brasileira, a cultura das vidas humanas e de toda a graça que existe no mundo.

Os dois últimos dias da Teia paulista de pontos de cultura Guarulhos/SP foram preenchidos por debates, grupos de trabalho, plenárias e outras coisas mais para alimentar a programação do II Fórum paulista de pontos de cultura.

Um fórum é como uma escola, ¨você sempre irá aprender e ensinar alguma coisa, errando ou acertando, mas sempre irá aprender ensinar alguma coisa¨ e novamente as sábias palavras de Lumumba me vem a mente. Aprendi a escutar, entender e me posicionar nos momentos corretos. Aprendi isso errando e acertando. O grupo de trabalho que participei foi definido seguindo o critério de Macro Regiões, desenvolvido para conseguir permitir um coro interessante de pessoas por regiões no estado de São Paulo. Eu era um dos representantes da região Central, estavam presentes também as regiões de Ribeirão Preto, Franca e Barretos neste grupo de trabalho.

Os temas debatidos pelas pessoas eram os mesmos em todos os grupos de trabalho (ao todo 12 GTs) os grupos eram coordenados por uma facilitadora e um redator. Essa dupla facilitadora/redator eram os responsáveis por sistematizar o pensamento e as diretrizes desenvolvidas pelo grupo e apresentar esse conteúdo na plenária para todos os pontos de cultura e representantes do poder público.

No primeiro dia dos GTs, as pessoas se apresentaram e teve início o debate. Um senhor que também entrou na rede pelo edital de pontos de cultura do estado de SP começou a tentar pautar o debate, levantando questões como capitalismo agressivo, levar a cultura àqueles que não tem (sic), questionamentos como por que as mulher, gays e negros não estão no poder e outras frases chavões que caracterizam tanto o preconceito e o racismo do pensamento branco hegemônico da sociedade paulista. Dessa vez toda minha raiva e indignação não precisaram ser contidas, todo meu sentimento pôde ser colocado para fora por minhas palavras e pela inteligência coletiva.

Resumindo fui pra cima, desmoralizei o discurso do cara e de bate pronto conquistei meu primeiro opositor na rede e me posicionei junto àqueles que lutam por uma transformação social pela cultura. As pautas que ele tentava trazer foram todas combatidas e um pensamento sobre cultura pôde ser desenvolvido pelo grupo.

E esse foi apenas o primeiro dia! Depois as pautas foram levadas e aprovadas pela plenária tendo início o segundo dia de debates dos Grupos de Trabalho. Era o momento de decidirmos quem faria parte da comissão paulista de pontos de cultura e o que é essa comissão, quais são as entregas que ela deve fazer para aproximar os pontos e tentar começar a construir algo como um movimento social.

Novamente nosso amigo reacionário tentou pautar o debate e novamente eu e outros membros do nosso grupo de trabalho nos posicionamos contrariamente às suas opiniões trazendo outros debates para a rede. Entendi então qual o grande problema do edital que participei e que nos inseriu na rede de pontos de cultura. O programa Cultura Viva não foi descrito no edital e todas as pessoas do nosso grupo que eram como eu, filhos da nova geração do edital, não conheciam o programa. Isso já acendeu um sinal de alerta na cabeça de todos! O programa é a base conceitual e o plano que permite uma mínima identidade entre os pontos de cultura, sem esse norte há uma grande chance de se deturpar e mudar o caminho que os pontos estão trilhando. As pessoas presentes entenderam a importância de se informar sobre o programa Cultura Viva. O próprio catálogo que recebemos no credenciamento do evento já é suficiente para se introduzir o programa.

Esse foi o dia que mais consegui participar e ajudar. Trouxe uma ferramenta que já existe e está em prática no movimento social que faço parte, o Circuito Fora do Eixo. A ferramenta é a da circulação, aproveito o espaço aqui para colar o tema que foi levado como uma das diretrizes dessa comissão e que será o trabalho que irei desenvolver junto aos outros pontos ao longo desse ano:

A circulação é a ferramenta para criar musculatura e melhorar a relação entre os próprios pontos de cultura. Pois um representante de um ponto de cultura viajando pela macro, visitando todos os pontos, conhecendo as bases desses pontos, dormindo na casa desses pontos, vendo as apresentações, os trabalhos de formação que eles desenvolvem e aproveitar esses encontros para que longe de um contexto influenciado pelas campanhas políticas, permita a criação de um campo fértil para surgirem as pautas e as propostas como movimento.

Após o debate e a redação das diretrizes, começamos a escolher quem seriam os representantes da comissão paulista de pontos de cultura. Aí cometi meu maior erro, elaborei na minha cabeça a comissão ideal e a propus em minha primeira fala. O erro foi não ter conversado isso com todas as pessoas antes e ao invés de falar a comissão que considerava ideal, apenas me colocar à disposição de compor essa comissão.

A comissão que propus foi a mais votada e será a representante da nossa macro região na próxima comissão paulista dos pontos de cultura. A única pessoa que não votou em mim foi o amizade reacionário, esse talvez tenha sido um grande acerto meu, deixei claro minha posição, não estava ali pra compor com ele nem para evitar um desgaste, estava personificando a resistência a esse cara.

Fui escolhido pelo grupo de trabalho para apresentar nossas idéias frente à plenária. Consegui executar esse trabalho, confesso que um certo nervosismo tomou conta de mim alguns minutos antes da apresentação. Mas lembrei das sábias palavras que meu camarada Felipe Silva disse minutos antes da plenária:¨lembre-se, mantenha a respiração calma o coração batendo no mesmo ritmo, não deixe as emoções te conduzirem, seja verdadeiro que vai dar tudo certo¨. Então parei, tentei meditar um pouco, olhei para as pessoas que me passavam confiança, peguei o microfone e apresentei as ideias, foi tudo calmo, simples e natural.

Então as propostas todas foram apresentadas e começou o debate para eleger o representante e seu suplente do estado de São Paulo na comissão nacional dos pontos de cultura. Aí o bicho pegou!!! O moderador da mesa, que mais parecia um trator do que um ser humano, atropelava a tudo e a todos. Até que Iki Banto se revoltou e começou a questionar aquele comportamento e todos começaram a questionar o valor daquela mesa na condução do debate. Então a mesa ficou um pouco mais humilde... O ser humano é impressionante mesmo, o cara só por ter o microfone e uma experiência em moderação se achava um Deus que podia humilhar e menosprezar os outros, só quando uma pessoa se revolta levanta a voz e ameaça sua integridade cai a ficha da pessoa que ela está sendo escrota e precisa mudar seu comportamento.

Talvez esse seja o grande ponto, não podemos mais baixar a cabeça nem aceitar as coisas que são enfiadas goela a baixo, já é hora de levantar a cabeça, olhar para os lados e ver que não estamos sozinhos, ver que estamos juntos, caminhando em uma mesma direção, que nossas armas são a nossa cultura, que nossas bases são nossas famílias (no sentido mais amplo que essa palavra possa ter), as pessoas que nos amam e todos aqueles que estão conosco onde quer que vamos. Estamos juntos, mudando o comportamento, vivendo a transformação em nossos corpos, corações e mentes. Ninguém veio ao mundo, está vivo sem um motivo, sem um propósito, estamos vivos e temos de agradecer isso pois esse é o espaço e tempo que temos para mudar, deixar algo para aqueles que virão, olhar para os que já existiram e mostrar seu valor, transcender por nossas ações o corpo e a alma tornando nossas vidas ecos de alegria e transformação, semeando novos mundos onde o dinheiro e a ciência não são maiores que a natureza e a saúde dos seres humanos.

Aproveito essas últimas linhas para deixar aqui uma referência às pessoas importantes que me ajudaram a entender toda essa transformação social que estou vivendo durante a Teia: Daniel (São Carlos), Lumumba (São Luís do Paraitinga), Mariana di Stella (São Paulo), Tony (Franca), Joice (Hortolândia), Iki Banto (Campinas), os pretos do hip hop que improvisavam nas festas disparando palavras como flechas na alma das pessoas, as mulheres que cantavam e batucavam como deusas e todos aqueles que com um sorriso, dançando e cantando comigo viveram momentos marcantes que se perderão em nossas memórias mas ecoarão por toda a eternidade.

Mulher brasileira / aonde é que está você?

Um beijo Brasil! Essa noite iremos dormir juntos em braços esplêndidos para acordar em outro lugar, em um novo mundo.

Um comentário:

Mariana Di Stella Piazzolla disse...

Assim que escreve meu nome: Mariana Di Stella (com dois eles), rs.

To enchendo! Nos vemos em um mês. Eu tb voltei já com saudades de todos! Principalmente da produção e equipe de comunicação, porque não tive muito tempo para socializar com os amig@s antigos e conhecer os novos pontos :(

beijos

Mari